Os Indígenas Canela
Os Canelas são
compostos das cinco nações remanescentes dos Timbira Orientais, sendo a maior
delas, a dos Ramkokamekrá, descendentes dos Kapiekran (como eram conhecidos até
1820). O nome Canela era também utilizado pelos sertanejos para os Apanyekráe
os Kenkateye, que foram massacrados e dispersos em 1913. Ademais, os Kenkateye
separaram-se dos Apanyekrá por volta de 1860.
Atualmente, o grupo Ramkokamekrá se autodenomina com o nome português Canela. Ramkokamekrá significa “índios do arvoredo de almécega”. Usam o termo Me(n)hi(n) para se referir aos Timbira Orientais. Não se sabe ao certo, mas é provável que o nome Canela seja uma referência ao fato desses indígenas serem visivelmente mais altos quando comparados pela população regional a seus vizinhos Guajajara.
O grupo Apanyekrá é
conhecido pela bibliografia apenas por esse nome e suas variações ortográficas,
ou ainda por Apanyekrá-Canela. Apanyekrá significa “o povo indígena da
piranha”. Nimuendajú supõe que eram chamados por esse nome pois pintavam o
maxilar inferior de vermelho, referindo-se à imagem desse peixe carnívoro.
Língua
Os Canela e os Krahô
falam a mesma língua da família Jê, no tronco Macro-Jê, com pequenas variações.
Além disso, entendem o Krikati/Pukobyé com facilidade e, certamente, o Gavião
de Tocantins. Já o Apinayé (Timbira Ocidental) é tão diferente do Canela como o
espanhol é do português. Um Canela não compreende o Xavante (Jê Central) ou o
Xokleng (Jê Meridional), e apresenta muita dificuldade para compreender o
Xikrin (Jê setentrional).
Muitos Canela
conseguem se manifestar em português, mesmo que não o pronunciam corretamente.
Os Ramkokamekrá têm maior domínio dessa língua do que os Apanyekrá. Entre
aqueles que o falam, os homens falam melhor o português por contarem com mais
experiências urbanas e por praticarem o comércio.
São explícitos os
aspectos de dualismo em língua Canela, na medida em que quase todos os verbos
possuem duas formas básicas alternadas. Dos 30 fonemas Canela, 17 são vogais,
dois são semivogais e onze são consoantes. Isso resulta numa quantidade incomum
de sons vocálicos transmissores de significados, além disso, a língua dos
Canela não possui ditongos, mas faz distinção fonêmica entre vogais longas e
breves.
História de Contato
Os Kapiekran,
ancestrais dos Canela, foram indiretamente contatados por forças militares no
fim do século XVII, mas foi apenas durante a última década do século XVIII que
ocorreram incursões contra sua população e seu modo de vida. Ataques periódicos
partiam das milícias locais ou bandeiras, organizadas para tomar e assegurar as
terras dos Kapiekran, empregadas na agricultura e criação de gado ao longo dos
rios Itapicuru e Alpercatas, a nordeste e oeste de Picos. Dizimados por essas
guerras, os Kapiekran, em 1814, renderam-se às forças brasileiras da região, em
Pastos Bons, em troca de proteção. Seus remanescentes, bem como os de outras
várias nações timbira, foram autorizados a se estabelecerem no canto noroeste das
terras ancestrais dos Kapiekran. No final de 1830, eles ocuparam por volta de
5% das antigas áreas de coleta desse povo.
Por cem anos seguiu-se
uma relativa paz e limitados contatos com os sertanejos, até que, em 1938, o
Serviço de Proteção aos Índios (SPI) enviou um agente para morar com sua
família próximo à aldeia Ramkokramekrá. Esse relacionamento causou-lhes
acelerada mudança cultural. O trabalho de campo de Nimuendajú para seu grande
estudo sobre os Canela, The Eastern Timbira, foi realizado, felizmente,
antes do início desse processo, durante seis visitas entre 1929 e 1936O SPI se
impôs de tal modo às autoridades indígenas que tornou ineficaz a liderança por
classe de idade, o que era essencial para garantir a realizaçã anual do
trabalho nas roças familiares. Esse enfraquecimento de lideranças contribuiu
significativamente para a perda da auto-suficiência da produção agrícola, até
os tempos atuais.
As tradições culturais
também não passaram despercebidas ao contato. Em 1951, ocorreu a morte de um
importante chefe ramkokramekrá, Hàk-toot-kot, grande conhecedor e promotor das
tradições Canela. Ao mesmo tempo, nessa época iniciou-se o ensino da escrita.
Já na década de 1970, a incipiente assistência de saúde proporcionada pela
Funai fez crescer a confiança nos medicamentos farmacêuticos, possibilitando o
crescimento populacional. Conjuntamente, missionários da Wycliffe Bible
Translators traduziram o Novo Testamento para a língua dos Canela e propagaram
novos valores entre os Ramkokamekrá.
O movimento
milenarista ocorrido entre os Ramkokamekrá em 1963 contribuiu de forma
significativa para o descrédito nas antigas tradições. O fracasso do movimento
só fez acentuar esse descrédito, além de serem obrigados a se transferirem
temporariamente para uma área Guajajara perto de Barra do Corda, de modo a
escaparem da vingança dos fazendeiros. Essa mudança forçada para uma zona
ecológica diferente os expôs a tipos diversos de agricultura e caça, assim como
à convivência com os Guajajara, grupo de língua Tupi, e com a cultura urbana
brasileira.
Os Apanyekrá são
citados pelo militar Francisco de Paula Ribeiro, no final da década de 1810.
Pelas menções, parece que eles habitavam a área montanhosa a oeste dos
Kapiekran, localizada muito ao norte dos caminhos dos vales de rios utilizados
pelos colonos brasileiros (pelo Itapicuru e baixo Alpercatas, e pelos rios
Parnaíba e Balsas). Desse modo, sofriam menos ataques de jagunços, já que
estavam menos expostos que os Kapiekran, que habitavam as terras mais planas a
leste e a sul ao longo do Itapicuru e do baixo Alpercatas. No início dos anos
1830, as terras férteis das nascentes do rio Corda e seus arredores foram
ocupadas por uma família que criava gado. Então, os Apanyekrá passaram a
conviver com sertanejos que viviam imediatamente ao sul, o que não aconteceu
com os Ramkokamekrá.
Os Apanyekrá possuem histórias muito antigas, provavelmente do século XIX, que relatam uma época na qual estiveram sujeitos ao forte controle de um fazendeiro local. Ele os empregava em sua fazenda e em tarefas de sua casa, seus jagunços dormiam com suas mulheres. O fazendeiro costumava fornecer gado para festas, nas quais todos dançavam à moda sertaneja (abraçados).
Em torno de 1950, o SPI começou a pagar um sertanejo para viver com os Apanyekrá e ali estabelecer um posto. Em contraste com os encarregados do posto Ramkokamekrá daquele tempo, o encarregado dos Apanyekrá era mais respeitoso e discreto em relação aos índios, e os protegia dos fazendeiros. Os Apanyekrá continuaram mudando frequentemente sua aldeia para diferentes locais em suas terras, levando consigo o “posto elementar” e o encarregado. Foram encontradas aldeias na área de Águas Clara em 1958, Porquinhos em 1960, Rancharia em 1966 e 1971, e em outro lugar da área de Porquinhos em 1974 e 1975. Desde então, eles não mudaram deste último local, permanecendo próximos ao novo posto da Funai e do prédio da escola com sua enfermaria, ambos construídos em alvenaria e telha no início da década de 1970.
Em 1963, quando os fazendeiros atacaram os Ramkokamekrá, que se alçavam num movimento messiânico, ameaçaram também tomar as terras dos Apanyekrá. As ameaças continuaram e algumas terras periféricas foram ocupadas por um fazendeiro, o que levou a guarnição militar de engenharia sediada em Barra do Corda a estabelecer uma pista de pouso na área de Porquinhos por volta de 1965, para proteger os índios.
Os Apanyekrá eram mais isolados do que os Ramkokamekrá não apenas porque aqueles estavam mais distantes de Barra do Corda, mas também porque as florestas ao longo do rio Corda se estendem quase continuamente entre a cidade e Porquinhos, dificultando a construção de uma estrada direta entre as duas. À estrada de Barra do Corda para os Ramkokamekrá, ao contrário, atravessava quase somente florestas de arbustos e cerrados e necessitava apenas uma ponte, construída em 1971. Por volta de 1978, caminhões que saíam de Barra do Corda para Porquinhos dirigiam-se primeiro para o sul até a aldeia Ramkokamekrá de Escalvado/Ponto, de modo a cruzar o cerrado perto das cabeceiras dos diversos cursos d’água da área em pontes recém-construídas para alcançar Porquinhos.
Organização Política
Existem classes de
afiliação vitalícia formada pelos Canela, elas iniciadas a partir de quatro
cerimônias. Cada classe de idade consiste em homens nascidos num período em
torno de dez anos. Assim, classes de idade de homens por volta de seus 10, 30,
50 e 70 anos sentam-se de um lado; enquanto homens em torno de seus 20, 40 e 60
anos sentam-se do outro lado.
Eles possuem várias
atividades formadas por essas metades ou por classes de idade opostas. Além
disso, são feitas competições de danças e cânticos cerimoniais ou cotidianos,
corridas rasas ou com toras, assim como a abertura de roças, caçadas para
cerimônias, abertura de estradas ou de picadas sobre a linha divisória da Terra
Indígena. A cada 20 anos (dez anos entre os Apanyekrá), a classe ocidental -
cujos membros estão se aproximando dos 50 anos de idade - tradicionalmente
transfere-se para o centro do pátio, na qualidade de mais velhos, os pro-khãm-mã
(mikhà para os Apanyekrá). Por sua vez, a classe oriental - cujos
membros acabaram de passar dos 50 anos de idade - junta-se àquela, formando o
conselho dos mais idosos. Os homens da metade oriental aconselham, mas não
governam.
O conselho dos mais idosos selecionava o chefe, que costumava governar pela vida inteira. Atualmente, ele se mantém no cargo de seis meses a dois anos. O chefe encarrega-se das relações externas e assume a maior parte das iniciativas internas. O conselho dos idosos geralmente o apoia, mas pode exercer sutil oposição e bloquear ou alterar decisões impopulares. A atribuição especial dos mais velhos é planejar e conduzir as extensas festividades.
Atividades Produtivas
Existem classes de
afiliação vitalícia formada pelos Canela, elas iniciadas a partir de quatro
cerimônias. Cada classe de idade consiste em homens nascidos num período em
torno de dez anos. Assim, classes de idade de homens por volta de seus 10, 30,
50 e 70 anos sentam-se de um lado; enquanto homens em torno de seus 20, 40 e 60
anos sentam-se do outro lado.
Eles possuem várias
atividades formadas por essas metades ou por classes de idade opostas. Além
disso, são feitas competições de danças e cânticos cerimoniais ou cotidianos,
corridas rasas ou com toras, assim como a abertura de roças, caçadas para
cerimônias, abertura de estradas ou de picadas sobre a linha divisória da Terra
Indígena. A cada 20 anos (dez anos entre os Apanyekrá), a classe ocidental -
cujos membros estão se aproximando dos 50 anos de idade - tradicionalmente
transfere-se para o centro do pátio, na qualidade de mais velhos, os pro-khãm-mã
(mikhà para os Apanyekrá). Por sua vez, a classe oriental - cujos
membros acabaram de passar dos 50 anos de idade - junta-se àquela, formando o conselho
dos mais idosos. Os homens da metade oriental aconselham, mas não governam.
O conselho dos mais idosos selecionava o chefe, que costumava governar pela vida inteira. Atualmente, ele se mantém no cargo de seis meses a dois anos. O chefe encarrega-se das relações externas e assume a maior parte das iniciativas internas. O conselho dos idosos geralmente o apoia, mas pode exercer sutil oposição e bloquear ou alterar decisões impopulares. A atribuição especial dos mais velhos é planejar e conduzir as extensas festividades.As colheitas tradicionais canela incluíam amendoim, milho, batata-doce, inhame, abóbora, feijão-de-corda (Phaselous sp.), mandioca-brava (wayput-re), macaxeira, algodão, cabaças e outros produtos. Os gêneros mais comuns hoje - a mandioca, arroz e feijão - foram adotados depois do contato com a sociedade nacional, bem como banana, laranja, manga, melancia, abacaxi, mamão, tabaco, cana-de-açúcar e outros itens. Entre os Ramkokamekrá, nas pequenas florestas-galeria de sua terra, roças ribeirinhas eram abertas com machados de pedra e queimadas. Essas roças tradicionais produziam menos de 25% do alimento, enquanto coleta, pesca e caça supriam o resto. No final dos anos 1830, o reassentamento em áreas que representavam por volta de 5% das terras que ocupavam obrigou os Ramkokamekrá a praticar mais extensivamente o sistema de roças de coivara, de acordo com o modelo regional.
No final dos anos 1940, a economia de ambos os grupos tornou-se deficiente, dependendo de apoio externo para se manter. Assim, passaram a depender significativamente dos alimentos fornecidos pela agência indigenista e praticar o sistema de “meia” com os moradores, trabalhando em suas terras para ficar com metade da produção. No entanto, no início de 1990, entre os ramkokamekrá as roças voltaram a produzir alimento suficiente para sua sobrevivência. Contudo, eles continuam a ter uma produção insuficiente nos magros meses que vão de setembro a dezembro. As roças começam a produzir em janeiro e o ápice da produção se dá com a colheita de arroz no mês de maio. Já os Apanyekrá não alcançaram esse retorno à auto-suficiência, entretanto mantiveram mais plantas nativas que os Ramkokamekrá e cultivavam suas roças de modo menos influenciado por métodos sertanejos.
O desafio enfrentado atualmente pelos Canela Ramkokamekrá consistem em garantir uma produção suficiente de alimentos de forma que os gêneros disponíveis não terminem em setembro. Dessa forma, eles não teriam que consumir as primeiras raízes de mandioca, com apenas um ano de crescimento, e, portanto, pouco desenvolvidas. Com a produção suficiente de mandioca, poderiam consumir apenas as raízes cultivadas há dois ou três anos. Algumas famílias vêm procurando produzir um excedente que possa ser comercializado com os sertanejos ou nos mercados das cidades.
Por enquanto, as matas ribeirinhas existentes na Terra Indígena apresentam-se como possibilidade de sustento para a população ramkokamekrá em expansão, através da prática da agricultura de coivara. Uma fonte adicional de renda são as pensões dos aposentados pelo Funrural, que se tornaram uma ajuda econômica significativa a partir da década de 1980. Ademais, há vários aposentados por razões de saúde, mães que recebem ajuda e estudantes bolsistas. Até o final dos anos 1990, existiam em torno de 60 a 70 pensionistas na aldeia Escalvado. Adicionalmente, em 2001 existiam oito índios ramkokamekrá empregados na Funai (Fundação Nacional do Índio), três na Funasa (Fundação Nacional de Saúde) e quatro professores índios no município.
Tradicionalmente, há uma tendência
de as irmãs colocarem suas roças na mesma área, seguindo o padrão da “casa
comprida” na aldeia. Entretanto, homens motivados politicamente tentam atrair
adeptos masculinos para suas áreas de roças. Formando-se então as facções, ainda
que os Canela sejam discretos quanto às rivalidades políticas. O poder de
chefes potenciais emerge, no entanto, a partir da “direção” de um local de
roça.
Atualmente, existem duas grandes “comunidades de roça” no grupo ramkokamekrá, cada uma com um círculo de casas, que assentam 80% da população. Há ainda pelo menos quatro agrupamentos menores. Mesmo assim, cada família mantém uma casa na aldeia principal, Escalvado, e para lá retorna para as festas anuais. Contudo, ultimamente, tem havido um movimento de volta à aldeia por parte das famílias que têm filhos frequentando regularmente a escola do Escalvado. Estas passam mais tempo na aldeia principal, indo apenas de vez em quando às roças em busca de legumes.
Estrutura Familiar
Eles moram em casas de
palha de palmeira ou pau-a-pique, ao estilo sertanejo, construídas em torno de
um grande caminho circular com aproximadamente 300 metros de diâmetro,
incluídos os pequenos quintais atrás de cada casa. Uma praça com
aproximadamente 75 metros de diâmetro fica no centro, e, como raios da
circunferência, saem caminhos do pátio central para cada casa. Atrás da maioria
das casas localizam-se outras, da mesma família, formando uma segunda fileira
e, às vezes, casas mais distantes iniciam uma terceira fileira.
O parentesco é
reconhecido bilateralmente, apesar da ênfase matrilateral. Não existem clãs,
mas apenas um certo número de linhagens isoladas e cerimônias para transmitir o
direito de desempenhar certos papéis.
No caso dos Apanyekrá, foram registradas várias exceções ao padrão de residência matrilocal. Em contraste, quaisquer exceções entre os Canela me eram explicadas como temporárias.
Artes
As maiores expressões
da arte canela são as formas musicais e as danças acompanhadas de cantos. O
ciclo diário dos Canela inclui três períodos de danças cantadas, que vão das
2:30 às 5:30 da manhã, aproximadamente; das cinco às seis da tarde e das sete
às dez horas da noite. O tempo gasto nas danças e cantos, de mais de um quarto
do dia, demonstra a ênfase dada a essa manifestação de arte, embora raramente a
mesma pessoa complete a rodada inteira de sete horas. Esse ciclo ocorre
unicamente quando os Canela estão reunidos e vivendo na aldeia principal, e não
dispersos pelas aldeias de roça ou exercendo as parcerias com moradores
vizinhos.
O canto e dança
apanyekrá no ritmo do mestre do maracá é quase idêntico, em forma e em seu
horário diário, à versão ramkokamekrá. Apenas o estilo musical das canções soa
um pouco diferente aos ouvidos. As canções ramkokamekrá enfatizam a sequência
harmônica, enquanto as apanyekrá realçam a linha melódica.
Os homens vagueiam,
exibindo-se e pulando diante de uma longa fileira de mulheres, todos guiados
por um homem que canta e dança com um maracá. Hoje em dia, tal dança ocorre
somente nos períodos das grandes festas.
Entre os Canela, o
urucum é passado no corpo em situações familiares. O carvão, quando fixado pelo
látex extraído do "pau de leite" e aplicado de maneira ordenada no
corpo é uma manifestação familiar; quando aplicado sem cuidado ou ordem, é um
indício de que a pessoa esteve recentemente envolvida em um caso extraconjugal.
A tintura azul-escura do jenipapo é usada unicamente em uma determinada
situação cerimonial, jamais no dia-a-dia.
Por ocasião de cerimônias solenes, o grupo Ramkokamekrá se ornamenta com penugem de gavião (agora substituída por penas de pato doméstico) colada no corpo com a resina de almécega e usada com urucum em padrões precisos. No caso dos Apanyekrá, há a aplicação adicional de penas verdes de periquito. Os artefatos materiais Apanyekrá são basicamente os mesmos dos Ramkokamekrá, embora os estilos sejam um pouco diferentes.
Religiosidade e
Xamanismo
Segundo a tradição canela, depois da morte a alma vai para uma aldeia de almas em algum local a oeste, onde vive em condições similares à vida em uma aldeia, exceto porque as coisas são amenas e menos agradáveis. Por exemplo, a comida tem menos sabor, a água é morna mas não fria e o sexo menos prazeroso. Depois de certo tempo, os espíritos tornam-se animais de caça, em seguida animais menores e, mais tarde, algo como um mosquito ou um toco de árvore. Finalmente, a entidade deixa de existir.
Almas que ainda estão sob a forma humana podem ser contatadas por xamãs. Mas se porventura alguém mantiver contato com elas ficará seriamente doente ou mesmo morrerá. Os Canela acreditam que se violarem determinadas regras, tais como ir ao mato durante a noite ou apanhar água do riacho depois do anoitecer, as almas podem pegá-los. De qualquer forma, as almas trazem prejuízos aos homens, e apenas os xamãs podem descobri-las. Acredita-se que, tempos atrás, poderosos xamãs tinham extraordinário poder sobrenatural, essencialmente os de omnisciência - o conhecimento e a antevisão de tudo. Isso, no entanto, só era possível mediante a ajuda das almas (os recém-mortos), que em sua maioria foram grandes xamãs enquanto vivos. Os bons xamãs convocam uma alma que lhes diz tudo o que precisam saber.
Os xamãs não competem por poder com os chefes políticos. Muitos chefes já tiveram algum poder xamânico, porém nunca à altura de um bom xamã. Raras vezes mulheres tornam-se xamãs, mas, nos anos 1970, havia várias mulheres xamã e duas, no mínimo, estão entronizadas na mitologia.
Localização e população
A Terra Indígena
Canela hoje está homologada e registrada. A principal aldeia ramkokamekrá,
Escalvado, localiza-se em torno de 70 km a sul-sudeste da cidade Barra do Corda,
no estado do Maranhão, é conhecida popularmente pelos sertanejos e moradores de
Barra do Corda como Aldeia do Ponto. Terras de cerrado, florestas-galeria e
pequenas chapadas ficavam no município de Barra do Corda, mas agora
localizam-se no novo município de Fernando Falcão. O limite sul da Terra
Indígena fica em grande parte delimitado pela serra das Alpercatas.
Em relação aos Apanyekrá, a regularização da Terra Indígena Porquinhos aconteceu no início da década de 1980. Encontra-se por volta de 80 km a sudoeste do município de Barra do Corda e 45 km a oeste da aldeia ramkokamekrá de Escalvado a aldeia principal dos Apanyekrá. Essa aldeia é localizada a leste da cidade de Grajaú, cortada por 75 Km de área de cerrado. Os Ramkokamekrá vivem em áreas de cerrado com pequenos igarapés, os Apanyekrá têm essa mesma ecologia a leste e sul, contando, no entanto, com extensas florestas a norte e oeste, eles têm vantagem de usufruir melhor o solo para a agricultura de coivara e maior abundância de peixes, além da caça na floresta e no cerrado devido estarem localizados perto do rio corda, que em alguns pontos tem até oito metros de largura.
A área do município da Barra em habitantes é de 519.033,90 e a de Fernando é de 508.658,90. Já na área da TI no município (ha) é de 53.529,00 em Barra da Corda e 126.114,75 em Fernando Falcão. No ano de 1990 a população na Terra Indígena era de 833, segundo os dados da 4° Suer/Funais. E no ano de 2000 aumentou para 1387, de acordo os dados da Funai/Barra da Corda e, por fim, no ano de 2011 foi de 2103 de habitantes, segundo os dados da Funasa/Palmas.
Processos de resistência, permanência e lutas do povo
O processo de
resistência do povo Kapiekran (originário do que hoje são os indígenas
Canela-Ramkokamekra), ocorreu por eles serem alvos de milícias locais do
Maranhão, pois eles tinham objetivo de tomar as terras dos Kapiekran, com o
intuito de utilizar essa terra para agropecuária.
Logo foram surgindo
várias guerras, o povo Kapiekran tiveram que se render, pois foram dizimados,
assim em troca de suas terras e tudo que abandonaram, eles queriam proteção
para o seu povo. Outras terras também foram concedidas ao povo Kapiekran, eles
se estabeleceram ao noroeste das suas terras ancestrais, que eram apenas 5% da
sua terra em relação do que antes era habitado (por volta de 1830).
Depois de muito tempo sem contato direto, vínculo ou assistência com esses povos, o Serviço de Proteção aos Índios (SPI) enviou um agente para morar com a sua família próximo a uma aldeia Ramkokramekrá, a partir desse período os Canela mudaram muito os seus costumes, suas culturas e o seu modo de vida. Outro contexto ocorrido foi a morte de Hàk-too-kot em 1951, que era conhecido por ser conhecedor do povo, promotor das tradições, organizador das introduções da escrita, influência de missionários, entre outros títulos relevantes.
Passado e presente
Com as pesquisas e
constatações feitas anteriormente, é notável as mudanças que houveram. A
religião, por exemplo, vem mudando com o tempo, desde 1830 eles partilham de
crenças do catolicismo. Nas atividades produtivas, atualmente, existem duas
grandes "comunidades de roça" no grupo ramkokamekrá, cada uma com um
círculo de casas, que assentam 80% da população. Há, pelo menos, outros quatro
agrupamentos menores. Mesmo assim, cada família mantém uma casa na aldeia
principal, Escalvado. E essas famílias retornam para lá para as festas anuais
de costume.
Na atualidade, contudo,
tem acontecido um movimento de retorno à aldeia por parte das famílias que têm
filhos frequentando regularmente a escola do Escalvado. Estas passam mais tempo
na aldeia principal, indo apenas de vez em quando às roças em busca de legumes.
Pib.socioambiental.org. 2021. Canela Ramkokamekrá - Povos Indígenas no Brasil . Disponível em: https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Canela_Ramkokamekr%C3%A1#Localiza.C3.A7.C3.A3o Acessado em 27 de dezembro de 2021.
Terrasindigenas.org.br. 2021. Terra Indígena Kanela | Terras Indígenas no Brasil. [online] Disponível em: https://terrasindigenas.org.br/pt-br/terras-indigenas/3719. Acesso em 27 de dezembro de 2021.