Mundukurus em aquarela, 1828, Hércules Florence |
Os Munduruku são um povo conhecido pela sua tradição guerreira e habitavam
culturalmente a região do Vale do Tapajós, sua terra de origem, que durante muito
tempo era chamada como Mundurukânia. Segundo a história Mundukuru, este povo
teria sido criado por Karosakaybo em uma aldeia chamada Wakopadi próximo ao rio
Krepori. Ainda no século XVII, os mundukurus começaram a travar guerrilhas contra os
mura, grupo indígena que habitavam o baixo Rio Madeira. Em razão deste conflito
tiveram de buscar abrigo entre os portugueses e por estes ficaram conhecidos como os
“caçadores de cabeça”, pois os mundukurus atacavam as vilas portuguesas resistindo à
dominação colonial fazendo com que os portugueses solicitassem a Coroa armas de
fogo para poder intervir na resistência desse povo. Tal medida foi adotada muitas fezes
pelos portugueses para conseguir dominar o território brasileiro tendo em vista que para
eles os povos originários eram um fator dificultador para seu objetivo e diante a
resistência e não colaboração de muitos indígenas com a colonização, como no caso dos
Mundukurus, os portugueses destruíam suas tribos, os perseguiam e até mesmo os
exterminavam. Entretanto, foi estabelecido um acordo de paz e os mundukurus se
tornaram aliados dos portugueses em suas lutas a outros povos indígenas.
CULTURA, SOCIEDADE E TRADIÇÃO
“O Munduruku é o povo mais numeroso da região do sul do estado do Pará, atualmente são 12.000 indivíduos. Nos tempos passados, nós, Munduruku, éramos temidos devido à fama da arte de guerrear em bandos e usávamos estratégias para atacar os nossos inimigos. Não desistíamos tão facilmente de perseguir os nossos inimigos e os nossos troféus eram a cabeça humana, que simbolizava o poder. Dificilmente, nós, Munduruku, em uma expedição de guerra perdíamos um guerreiro sequer na batalha. Atacávamos os inimigos de surpresa, assim vencíamos os nossos rivais e não deixávamos ninguém com vida, somente as crianças que quiséssemos levar para a aldeia, que adotávamos e incluíamos em nosso clã para mantermos a relação de parentesco.” (Fonte: carta dos mundukurus ao governo – Disponível em: http://www.cimi.org.br/site/pt-br/?system=news&action=read&id=6962).
Na tradição munduku sua sociedade é composta por 38 clãs que são divididos em “vermelhos” e “brancos” o casamentos só pode ocorrer com integrantes do grupo oposto. Durante os primeiros anos de casamento o homem vive na casa de seu sogro auxiliando no sustento da família, após o nascimento do segundo filho o homem deixa a casa do sogro. Nas divisões de tarefas cada um possuía sua utilidade, entre homens e mulheres cabe ao homem o direito de caçar para alimentar a sua família e tudo que eles precisarem para sua subsistência e segurança. Já as mulheres sua tarefa era cuidar dos afazeres de casa, fazer alimentos, lavar roupas, capinar roças, fazer farinhas, cuidar das crianças etc.
Mulheres Mundurukus |
Antigamente as aldeias possuíam o Ukasa (Casa dos homens) era considerada uma casa sagrada, pois nela habitavam lideres muito importantes da aldeia: contadores de histórias, puxadores, cantores, tocadores de tabocas e flautas, líderes espirituais pajés, caçadores, artesãos, conhecedores de plantas medicinais, interpretadores de sonhos (premonitórios), mensageiros, guerreiros (divididos em cinco pelotões). As mulheres eram proibidas de entrar nesse ambiente e a elas cabiam a função de cozinhar alimentos e servi-los para agradar estes homens devido a importância deles.
A língua Mundukuru é pertencente ao tronco linguístico Tupi em conjunto com a língua Kuruáya. É falado por cerca de 13.000 mil pessoas no Brasil, de acordo com o Censo Demográfico de 2010. Atualmente, em alguns casos está língua vem entrando em desuso, em virtude do domínio de apenas do Português entre crianças e jovens que não falam plenamente Mundukuru.Sua principal forma de subsistência é a caça, pesca e agricultura cultivando diversos tipos de alimentos como, por exemplo, a mandioca, bananas, cana, cará e batatas. O trabalho agrícola é dividido por sexo: o homem prepara o ambiente para o plantio, fazendo a derrubada da mata. Já as mulheres geralmente capinam e fazem a colheita. Além disso, desenvolvem vários tipos de artesanatos como tecidos, cerâmicas e colares.
Ritual Munduruku, Edouard Riou, 1861
Tradicionalmente guerreiros, os mundukurus têm diversas expressões culturais
relacionadas a guerra e a sua força. A guerra possuía uma grande importância para eles
já que através desta obtinham troféus de guerra para demostrar à bravura de seu povo,
além disso, estes troféus eram considerados mágicos. O principal troféu a ser
conquistado era a cabeça de seu inimigo e seu preparo era realizado em um longo ritual.
RELIGIÃO
A religião do povo Munduruku nunca foi algo instituído, ela se dividia no xamanismo, nos costumes e rituais antigos e na crença em Karosakaybu. Na dissertação “Feitiçaria entre os Munduruku”, o xamã é definido como: “O xamã é o dono de um poder mágico que lhe permite ligações com animais e espíritos, tendo que passar por um rito de iniciação que implica a morte mística e uma mudança de personalidade”. Na religião munduruku os pajés têm um papel de suma importância, sendo responsáveis pela cura de doenças através de ervas e em alguns casos, do contato com espíritos.
Na participação de Alessandra Korap Munduruku e Kena Azevedo Chaves, no livro “Retratos da pandemia” Karosakaybu é definido como: “Karosakaybu tinha poderes de transformar os animais, as pessoas, as paisagens dos campos, de transformar seres humanos em animais e, ainda, de se transformar, ele mesmo, em animais. São inúmeros os relatos dessas metamorfoses, sendo que os Munduruku sempre reconheceram o Karosakaybu como autor e criador de tudo e todos. Karosakaybu criou todos os outros povos, contudo o que criou à sua imagem e semelhança foram os Munduruku”
Essa forma de definir seu criador como a sua imagem e semelhança vem de misturar com o cristianismo, que ao longo dos anos entrou no imaginário munduruku, suas crenças e costumes se mantêm de forma oral de geração em geração, tendo o contato com a natureza e os espíritos e também a interação com seus pajés, como fatos cotidianos.
TERRITÓRIO: LOCALIZAÇÃO E POPULAÇÃO
Mapa do território Munduruku |
Os povos da etnia Munduruku, habitam geralmente regiões nas margens de rios navegáveis e cercados por florestas. Sendo dividida entre os estados do Pará, Mato Grosso e Amazonas, que é por onde se alastra o rio Tapajós. A população de mundurukus chega a mais de 13.755 indígenas, e a maior concentração de sua população encontra-se na Terra Indígena Munduruku (PA), a qual possui seu maior número de aldeias alocadas em um rio afluente do Tapajós, o rio Cururu. Outros locais que os Munduruku habitam em menor escala são, município de Borba, próximo à transamazônica (AM); Rio Canumã, município de Nova Olinda (AM); município de Juara e região do rio dos Peixes (MT).
PROCESSOS DE RESISTÊNCIA E LUTA
Os Munduruku sofrem constantes ameaças de garimpeiros, madeireiros e grileiros que querem invadir as suas terras. Os invasores usam a justificativa de que as terras dos Munduruku não são demarcadas oficialmente e reconhecidas como áreas indígenas pelo governo federal. Apesar das denúncias constantemente feitas à Fundação Nacional do Índio (Funai) e ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), o problema não é resolvido, as terras não são demarcadas e o povo não recebe a proteção do governo. Dessa forma, a integridade de suas terras vem sendo colocada em risco e sua demarcação também. O estado ainda insiste na construção de hidrelétricas na bacia dos Tapajós que pertence aos Munduruku, essa construção invadiria sua área e destruiria seu território, influenciando negativamente não só em suas vidas, mas em toda comunidade ribeirinha, quilombola e em outros povos que vivem nesta área, como é ilustrado no trecho abaixo: Mapa de localização do território Mundukuru.
"O rio é o berço de tudo. O planeta se alimenta de água. O que a gente está sofrendo é a resposta dessa força. A gente está numa época de confusão e a primeira coisa a se fazer é ter união. A proteção da natureza precisa ser coletiva e mundial. Sobre as hidrelétricas no Tapajós, o povo Munduruku só tem uma palavra: não." — Professor Misael Amancio Kaba Munduruku.” (Fonte: https://bit.ly/3G6mAQt)
Manifestação Munduruku e Tapajós |
Leia a seguir o trecho inicial da carta:
“Diante desses fatos relatados sobre a nossa situação, comunicamos que estamos revoltados pelo modo como o governo brasileiro vem nos tratando. Vemos os desrespeitos aos nossos povos, a Constituição sendo rasgada, tornando-a inválida, para não termos os nossos direitos garantidos por ela. Agora, o nosso próprio território se tornou o campo de guerra, onde estamos sendo exterminados, assassinados a tiros pelas Forças Armadas do governo. Não temos mais direitos de gritar para sermos ouvidos e ninguém nos socorre enquanto estamos pedindo socorro.” (Fonte: carta dos mundukurus ao governo – Disponível em: http://www.cimi.org.br/site/pt-br/?system=news&action=read&id=6962)
Daniel Munduruku |
Abaixo veja o vídeo que mostra a luta povo Mundukuru pela sua terra e a importância dela para ele:
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
MUNDURUKU.
Povos indígenas no Brasil. 2014.
Disponível em: https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Munduruku. Acesso em: 05.
Jan. 2022.
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Acesso em: 07. Jan. 2022.
KALIL, Patrícia. Povos Munduruku e a resistência social,
cultural e ecológica da bacia dos Tapajós. Medium, 2016. Disponível em: https://bit.ly/3G6mAQt. Acesso
em: 07. Jan. 2022.
Carta dos Mundurukus ao Governo. 2013. Disponível em: :http://www.cimi.org.br/site/pt-br/?system=news&action=read&id=6962.
Acesso em: 07. Jam. 2022.
PONTES, Nádia e Felipe Silva. A luta do povo Munduruku
às margens do Tapajós. DW
Brasil, 2016. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=PQdZ_3_r8nA.
Acesso em: 07. Jan. 2022.
Em nome de quê? O apelo de
Beka Munduruku. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=1oyD7h5fCZ8.
Acesso em: 07. Jan. 2022.
A batalha Munduruku.
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=n1j2D60xSCg.
Acesso em: 07. Jan. 2022.